O privilégio de falhar
Blogs e Colunas | Amanda Neuman 02/02/2025 20h00Houve um tempo em que eu acreditava que a vida era uma sucessão de acertos. Eu, menina estudiosa, com cadernos sem orelhas e respostas sempre corretas, achava que o segredo da felicidade estava em fazer tudo do jeito certo. Mal sabia eu que o que me tornaria quem sou não seria a exatidão, mas os tropeços.
A primeira grande falha de que me lembro foi tentar andar de bicicleta sem rodinhas. Meu pai, com a paciência que só ele tinha, segurava o banco enquanto eu pedalava com medo de cair. Até que ele soltou. E eu caí. Bati o dente mole no chão e ele ficou ali mesmo. Chorei de frustração, prometi nunca mais subir naquela bicicleta ingrata. Mas, dias depois, tentei de novo. E de novo. Até que um dia eu fui. E descobri a sensação do vento no rosto, a liberdade de deslizar sem medo.
A vida adulta veio e, com ela, quedas mais sofisticadas: um estágio que não deu certo, uma amizade que não se sustentou, uma escolha que parecia promissora e virou encruzilhada. Mas sempre que me encontrava sentada no chão, esfolada por dentro, me lembrava da bicicleta. E tentava mais uma vez.
O que ninguém nos conta é que errar é uma experiência profundamente humana. O erro é um mestre severo, mas justo. Ele nos empurra para a autoanálise, nos obriga a escutar a voz interna que ignoramos nos dias de triunfo. A falha nos lapida, nos obriga a recomeçar com mais consciência.
E se a gente olhar bem de perto, vai perceber que a graça da vida está exatamente aí: nos planos que deram errado, nos improvisos que se tornaram histórias memoráveis, nos tropeços que nos ensinaram a dançar.
Falhar é um privilégio. É a prova de que tentamos, ousamos, nos colocamos em movimento. Quem nunca falha, nunca se arrisca. Nunca se permite descobrir o que existe além do medo.
Então, hoje, ao olhar para trás, vejo minhas falhas com gratidão. Foram elas que me construíram.
E que venham outras. Porque onde há erro, há tentativa. Onde há tentativa, há coragem. E onde há coragem, há vida — exatamente como deve ser.
Jornalista (UNIT) há 10 anos, mestra em Comunicação (UFS), doutoranda em Sociologia (UFS), pesquisadora na área de redes sociais e influenciadores digitais, e mentora de marketing para empreendedores e Influenciadores. Na internet, como mulher plus size que descobriu o amor próprio e auto estima além dos padrões, compartilha sua vida e vivências com outras mulheres e as encoraja a se amarem como são.
E-mail: amandaneuman.an@gmail.com
O conteúdo e opiniões expressas neste espaço são de responsabilidade exclusiva do seu autor e não representam a opinião deste site.