O INCRA é o maior "fazendeiro" de Sergipe
Os assentamentos do Incra ocupam quase 10% da área territorial do estado. Blogs e Colunas | Haroldo Araújo Filho 28/04/2023 15h46 - Atualizado em 02/05/2023 10h16Os 218 Projetos de Assentamento do Incra/SE, somados aos já 16 Territórios Quilombolas oficialmente delimitados, possuem juntos 12.139 famílias e ocupam mais de 200 mil hectares, ou seja, correspondem por quase 10 % da área territorial total do estado de Sergipe (Fonte: Incra/2022).
Inexoravelmente um dado expressivo, mas que não deve ser analisado superficialmente e nem baseado em uma simplória definição de quem tem terra é fazendeiro.
Deixando de lado o extravagante título, fruto da licença poética deste autor que propositalmente assim o titulou com o objetivo de prender a atenção do caríssimo leitor(a) para a importância do uso, da posse e do acesso à terra. Uma tema sempre em voga, ainda mais nos momentos atuais, onde a agropecuária se firma como das principais atividades econômicas do país e onde movimentos sociais do campo ameaçam resgatar a invasão de propriedades como instrumento para alcançar seus objetivos.
É óbvio que a terra é um bem sensível para a humanidade, quiçá o mais importante, por isso que toda proposta de poder de uma sociedade passa, obrigatoriamente, por seu uso, posse e acesso, como já discorrido nesta coluna no texto Acesso à terra.
Voltando a realidade sergipana, as mais de 12 mil famílias assentadas correspondem a uma população de 50-70 mil pessoas, as quais, se juntas estivessem em um único município seria um dos dez mais populosos de Sergipe.
Os dados aqui trazidos somados a realidade produtiva do rural sergipano, onde as principais atividades são realizados por pequenos e médios produtores, colocam Sergipe, sob os aspectos da justiça fundiária e desenvolvimento rural, em uma posição mais confortável em relação a muitos outros estados da federação. Destacando-se, por exemplo, os benefícios socioeconômicos trazidos pelas cadeias do leite e do milho aos municípios sergipanos.
Cristalino também afirmar que tais condições não transformaram Sergipe numa espécie de “Suíça” brasileira, onde não existem necessidades para o desenvolvimento socioeconômico das populações rurais, as quais, são dever do Estado prover.
Porém, a grande indagação que fica na mente da sociedade brasileira, em especial, na sergipana após o discorrido até aqui, é se o provimento das necessidades das populações rurais virão via invasão de propriedades como instrumento de pressão para alcançá-las. Claro que na mente sensata de qualquer cidadão esse não é um meio factível, muito porque a sociedade brasileira é formada por ideais liberais e democráticos, os quais conflituam com a matriz marxista-leninista ideológica da maioria dos movimento sociais no campo.
Ademais não é razoavelmente aceitável que os movimentos sociais e lideranças políticas justifiquem que as invasões ocorrem (ou ocorrerão) em áreas improdutivas, numa espécie às avessas de justiça com as próprias mãos, já que tal aferimento só pode feito pelo órgão fundiário federal (Incra), após Laudo Agronômico de Fiscalização, ou seja, uma afronta direta ao Estado Democrático de Direito e ao devido Processo Legal.
Como também, não se sustenta em pé, o argumento de que a invasão de propriedades é para forçar o Incra fiscalizar tais áreas, já que é uma ofensa direta ao disposto no Artigo 2º, parágrafo 6º da Lei nº 8.629/1993 “O imóvel rural de domínio público ou particular objeto de esbulho possessório ou invasão motivada por conflito agrário ou fundiário de caráter coletivo não será vistoriado, avaliado ou desapropriado nos dois anos seguintes à sua desocupação, ou no dobro desse prazo, em caso de reincidência; e deverá ser apurada a responsabilidade civil e administrativa de quem concorra com qualquer ato omissivo ou comissivo que propicie o descumprimento dessas vedações.”
Em consonância com o citado dispositivo legal está a fala do atual Ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, que em recente entrevista disse que o governo não terá diálogo com os movimentos enquanto invasões de terras continuarem e que essas são comparáveis com os atos do dia 08/01/23.
Por fim, fica evidenciado que a área sobre a posse do Incra no estado de Sergipe é extremamente relevante, e que somada à nossa estrutura fundiária, tornam escassas as chances do Incra encontrar grandes áreas improdutivas susceptíveis à desapropriação.
Nesse toar, conclui-se que insistir na estratégia de invadir propriedades rurais em nada favorece o ambiente em prol do desenvolvimento socioeconômico do rural sergipano. Na verdade, apenas, alimenta a sanha dicotômica da guerra ideológica e deixa em último plano as reais necessidades das populações rurais, inclusive daquelas 12 mil citadas em tela, como por exemplo, assistência técnica, infraestrutura, crédito, segurança jurídica e moradia rural.
Engenheiro Agrônomo do Incra/Ministério da Agricultura, formado pela Universidade Federal de Sergipe, pós-graduado em Irrigação (UFS). Secretário de agricultura de Riachão do Dantas (2005-2007); Superintendente regional do Incra em Sergipe ( 2016-2017); Delegado da Secretaria Especial de Agricultura Familiar e Desenvolvimento Agrário em Sergipe (2017); superintendente do Ministério da Agricultura (2019-2023). Antes de ingressar no serviço público atuou em empresas comerciais do ramo agropecuário.
E-mail: hafaraujo@yahoo.com.br
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