Milton Andrade: 'a Deso continuará sendo uma empresa pública' | F5 News - Sergipe Atualizado

Entrevista 
Milton Andrade: 'a Deso continuará sendo uma empresa pública'
Presidente da Desenvolve-SE explica concessão e garante que processo está sendo democrático
Economia | Por Daniel Soares 28/01/2024 13h20 - Atualizado em 28/01/2024 13h32


Milton Andrade está com uma importante missão neste momento. Como diretor-presidente da Agência Desenvolve-SE (criada pelo Governo com objetivo impulsionar o desenvolvimento econômico de Sergipe por meio da articulação entre os entes públicos e privados) , ele está diretamente ligado ao processo de concessão de parte dos serviços da Companhia de Saneamento do Estado de Sergipe (Deso).

O processo tem transcorrido com discussões acaloradas, mas sem entraves. Após a aprovação da Lei no final do ano passado que modificou as microrregiões de águas no território sergipano - etapa importante para a concessão - acontecem agora os debates do Colegiado da Microrregião de Água e Esgoto de Sergipe com todos os municípios sergipanos. 

Segundo Milton, essa fase transcorrerá sem maiores dificuldades. "Temos quase que unanimidade", assegura. Em entrevista ao Portal F5 News, ele explica mais sobre esse processo e diz que a previsão é de que a empresa concessionária esteja assumindo os serviços de distribuição de água no início de 2025. Confira a entrevista:


F5 - De forma geral, do que se trata esse processo para a concessão de parte dos serviços da Deso?

Milton Andrade: A concessão é do serviço de saneamento. Na Deso não tem nenhuma mudança, ela continua sendo uma empresa pública, tendo o Estado como sócio, como principal acionista e controlador, tendo o mesmo quadro de funcionários. O que muda é o seguinte: a Deso hoje é responsável pelas quatro etapas - captação bruta da água, tratamento, distribuição e tratamento do esgoto. Com a concessão ela passará a ser responsável somente pela captação da água e o tratamento. A distribuição e o tratamento de esgoto, onde a Deso hoje se mostra ineficiente - com percentuais de perdas próximos a 50% e onde é necessário um maior investimento próximo a R$ 6 bilhões para se atingir a universalização - será concedido ao particular para que, com o dinheiro do concessionário e com a expertise onde já está mais eficiente, se reduzam todas as perdas e se atinja pelo menos 90% do esgoto tratado. 

F5 - Fala-se muito dos R$ 6 bilhões em investimentos necessários. Como que isso será sanado com esse processo de concessão? 

Milton Andrade: A empresa que assumir a concessão vai ter essa responsabilidade, que é executar essas obras hoje orçadas em R$ 6 bi. A empresa vai pagar para ter direito à concessão e ainda tem a responsabilidade de fazer as obras. Uma coisa é a outorga, que é, vamos dizer assim, o pagamento pelo ponto. Para quem é comerciante, pagar pelo ponto da loja para poder instalar a loja. Com a outorga, o concessionário vai pagar pelo ponto, que é pelo contrato de exploração do serviço de água e esgoto. E os R$ 6 bi é o investimento necessário para poder atingir a universalização. Sergipe hoje tem aproximadamente 50% de esgoto tratado. É preciso chegar aos 90% até 2033. Para chegar até lá, são necessários esses investimentos.

F5 - Esse processo segue algum modelo já realizado em outros estados ou Sergipe está seguindo um caminho próprio?

Milton Andrade: Ele se assemelha ao que o Brasil todo tem feito. É um modelo padrão para outras concessões. Muita empresa já fez isso, sendo que o primeiro foi em Alagoas. Nós estamos corrigindo e adaptando modelos já adotados para que eles tenham uma forma mais eficiente do que os nossos vizinhos que fizeram.

F5 - Em sua avaliação, a forma como esse processo de concessão vem ocorrendo é a correta? Tem sido democrática?

Milton Andrade: Primeiro, é preciso destacar que o trabalho do sindicato é da democracia. Que é democrático que se tenha divergência. Mas, na minha opinião, não há nenhum tipo de preterimento de participação - pelo contrário. Em dezembro de 2023, o governador Fábio Mitidieri enviou para a Assembleia Legislativa o projeto da nova microrregião, que foi aprovado. O que eram 13 microrregiões passou agora a ser apenas uma. Antes, era 100% votação do Estado e agora, o Governo possui apenas 40% dos votos. Na legislação anterior, os municípios não apitavam em nada nas decisões de água e esgoto. Hoje, as cidades detêm 60% de peso de decisão. Isso é um número que por si só fala. Nada mais democrático do que você trazer os 75 municípios para a mesa, que eles tenham voz e que eles tenham voto. Eles passaram a ser a maioria e o Estado a minoria. Isso pra mim é muito claro de que não há nenhum tipo de preterimento a colaborações. Um outro ponto é que os estudos do BNDES se iniciaram em 2021 e estão disponíveis para quem quiser consultar. Ou seja, tem 3 anos de estudo e de discussões. Quantos anos são necessários? 15? 50? Quanto tempo nós vamos deixar a população sem água, sem esgoto? Mais 50? Estamos fazendo uma consulta pública em que qualquer cidadão poderá entrar e dar suas colaborações. Não é uma consulta que abriu e saiu em uma tarde, é uma consulta que está disponível. 

F5 - Como o Governo tem acompanhado as críticas de alguns setores acerca desta concessão?

Milton Andrade: Com naturalidade e abertos a adaptar aquilo que puder. Ninguém é dono da verdade, ninguém tem fórmula mágica, um modelo perfeito. Todas as críticas que são feitas, a gente primeiro reflete para ver se realmente tem alguma procedência. Se houver, a gente corrige o processo. Não havendo, seguimos em frente com a convicção de quem está fazendo o melhor para os sergipanos. 

F5 - Vocês já tiveram a primeira reunião do Colegiado da Microrregião de Água e Esgoto de Sergipe. Como está sendo o diálogo com os municípios? 

Milton Andrade: Basicamente, nós temos quase que unanimidade. Há uma crítica muito grande ao serviço de fornecimento de água em Sergipe. Tem municípios que passam 15, 20 dias sem água e isso é inadmissível. Aracaju também está vivendo um caos de falta de água. Toda a semana ficamos sabendo de comércio sendo fechado, afetando a geração de emprego e renda. Temos uma cobrança, uma pressão muito grande por parte dos prefeitos de que a gente adiante o máximo esse processo. Naturalmente, dois ou três municípios que claramente não estão aderindo ou abraçando, apoiando a causa com convicção. São Cristóvão, por exemplo, tem um ponto específico sobre a votação, se a Procuradoria Geral do Estado deveria fazer parte. Mas de resto, São Cristóvão também está praticamente de acordo. Está tudo navegando muito bem.

F5 - Outras opções foram estudadas? 

Milton Andrade: Sim, foi tudo colocado na mesa. O Rio Grande do Sul, por exemplo, optou pela privatização. A venda integrada da empresa foi o caminho que eles acharam melhor. O CNPJ, que era do Estado, passou a ser de uma empresa privada. Lá houve demissão e um monte de coisas diferentes daqui. A gente tem três atores aí que são beneficiados ou prejudicados: 1) é o usuário cidadão; 2) são os servidores; 3) o Estado, que é o acionista. A gente tentou encontrar um modelo e o único onde todos ganham e ninguém se fere é esse que foi adaptado aqui para a concessão parcial. Não tem perda para o servidor e nem para o usuário. Ao contrário, tem ganho para o usuário que está tendo serviço de melhor qualidade sem aumento de tarifas. Fica acertado em contrato que durante os primeiros anos não é permitido aumento em tarifas, somente a correção inflacionária, que ocorre todos os anos. Não terá demissão do funcionário, do servidor. E para o Estado terá um ganho muito grande que é retirar das suas costas a necessidade de investir R$ 6 bilhões. E a população ganhará com serviço universalizado.

F5 - Qual a previsão para a finalização desses processos?

Milton Andrade: Está muito recente ainda. Vamos fazer um para a divulgação de uma audiência pública para o início de fevereiro. Após a consulta pública, preparar as respostas. Todas as colaborações serão respondidas - não haverá uma sem resposta. Todas serão acatadas ou descartadas com fundamento. A gente prevê que no início de março o edital deve estar pronto para ser disponibilizado ao mercado para abertura do processo e leilão. É um espaço de 90 dias para que as empresas tenham tempo de visitação técnica, conhecendo as instalações da Deso. No final de maio, ou início de junho devemos ter o leilão. Após assinatura do contrato, durante seis meses nós teremos a operação assistida, onde a Deso continua operando a distribuição do tratamento de esgoto e o concessionário que vencer o leilão vai acompanhar o processo. Só depois disso, aí sim teremos a passagem da gestão para a empresa concessionária. Deixando tudo redondinho no início de 2025 teremos o concessionário operando. 

F5 - Como ficará a estrutura da empresa após essa etapa? Como fica a situação dos servidores? Vai ter perda de emprego?

Milton Andrade: Não, zero. Ao contrário, vai ter geração de emprego. A Deso tem hoje 1500 empregados diretos, concursados do quadro efetivo, e 2 mil terceirizados através de empresa contratada para prestar algum tipo de serviço. Naturalmente, esses terceirizados serão absorvidos pela concessionária, e os efetivos da Deso serão redirecionados para focar na captação e no tratamento. Em vez de estar fazendo tudo, terão especialistas em captação e tratamento de água. Além disso, a previsão é de que a concessionária, nos cinco primeiros anos, gerará 11 mil novos empregos com as obras e investimentos. Depois que acabar esse período, se estabilizará em 8 mil postos de trabalho. Vale lembrar que Sergipe, no ano passado, até o mês de novembro, gerou 14 mil empregos - isso é o segundo melhor ano da história do Estado. Então, um setor sozinho gerar 11 mil novos empregos em cinco anos, é uma grande conquista.

F5 - Qual a expectativa do impacto financeiro desta concessão? Quais os benefícios para as contas da Deso e do Estado?

Milton Andrade: O Estado nos últimos 10 anos, em média, aportou na Deso R$ 80 milhões por ano a título de Adiantamento Futuro de Aumento de Capital (AFAC), que é uma sigla contável para quem está aumentando o capital de uma empresa da qual se é sócio. Porém, até 2022, a Deso tinha uma média de lucro muito pequena, próximo a R$ 4 ou R$ 5 milhões. Em 2022 e 2023, teve um resultado melhor, superior a R$ 40 milhões de lucro, mas muito distante dos R$ 6 bilhões de investimento que precisamos. Nesse ritmo, precisaremos de uns 150 anos para chegar a universalização. A Deso vai ficar mais lucrativa, porque ela vai se concentrar na parte em que ela é eficiente, que é a captação e o tratamento. A previsão é de que os lucros da empresa dobrem com essa mudança. Temos a convicção de que um novo ciclo de crescimento econômico vai sair junto com uma nova oportunidade de geração de emprego. Só desse setor, serão quase R$ 1 bi por ano de investimentos. Isso vai garantir um crescimento de 1,5% de crescimento real do PIB, que é muita coisa.

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