Invisibilidade social. Ver e não perceber, eis a questão
Tema da sociologia designa pessoas invisíveis aos olhos sociais Cotidiano 30/10/2011 07h00Por Sílvio Oliveira
O senhor deu bom dia ao porteiro do seu prédio hoje? Ao menos, observou o pedinte da esquina da padaria? O senhor ao pedir um caranguejo no restaurante olhou nos olhos do garçom? É possível lembrar se o cobrador do ônibus que o transportou ao trabalho era um homem ou uma mulher? Se as suas respostas, ao menos a maioria delas, são um ‘não’, o senhor engrossa uma lista de pessoas que contribuem para a ‘invisibilidade social’. O termo, que vem sendo discutido na sociologia, surge para designar as pessoas que ficam invisíveis aos olhos sociais, por preconceito, banalização do cotidiano ou mesmo familiarização com ele.
Para se ter uma ideia, no calçadão da rua João Pessoa, milhares de pessoas passam todos os dias, vêem o mendigo, mas não o e percebem. Alguns por questões sociais em não identificá-lo como integrante de uma classe social, outros por banalizarem a vida do indivíduo, ou seja, de tanto vê-lo terminam se familiarizando com a situação. O mendigo passa a ser ignorado de tal forma que é visto apenas como se fosse um objeto da paisagem.
Maria de Lourdes dos Santos, 65, faz parte não apenas desse contexto, mas também da paisagem do centro de Aracaju há mais de 10 anos. Ela se configura como uma das centenas de invisíveis sociais. Sentada na porta de uma igreja, ela começa uma jornada de mais de 10 horas como pedinte, mas pouca gente a vê. Viúva, mãe de cinco filhos, a senhora diz não se preocupar quando não lhe dão um bom dia ou quando passam sem percebê-la e acaba o bate-papo numa boa gargalhada. “Sou feliz assim e não me preocupo com os outros”, declarou.
O gari José Adilson da Silva, 22, é mais um dos personagens invisíveis aos olhos da sociedade. Ele varre os calçadões, mas pouca gente o percebe. Diferente da Maria de Lourdes, todavia, seu José não esconde a mágoa por não ser notado. “É difícil alguém me dar um bom dia. Claro que se o pessoal falasse comigo eu me sentiria mais feliz”, afirmou. Perguntado se essa indiferença incomoda, ele foi rápido ao responder que sim.
O cobrador Silvan José, 30, também engrossa a longa lista de profissões esquecidas aos olhos da população. “Vejo a mesma pessoa todos os dias, sei onde ele pega o ônibus, ou desce, me vê, mas sei que é um ver sem sentido algum. Se me vê em outro local, não me reconhecerá”, afirmou.
Dentre os diversos tipos que podem levar à invisibilidade social, a majoritária é a econômica, e muitas vezes abrangem as ligações culturais, sociais e estéticas. “Por vezes, está relacionada com a questão de subordinação que é dada pelo olhar. Depende também do lugar que ocupa, e associado ao lugar, códigos que o identificam, como a roupa, os adereços, o modo de falar”, afirma o psicólogo Francis Deon Kich, que lembra de um estudo feito pelo psicólogo Fernando Braga da Costa, ao trocar o dia a dia por um uniforme de serviços gerais e trabalhar em uma universidade de São Paulo. “Ninguém o reconhecia. As pessoas têm aversão às classes sociais mais baixas que as delas. Acreditam que estão ali porque não teve oportunidade, capacidade, é um ser humanamente inferior e não é passível de ascensão social”, resumiu.
Olhar e invisibilidade
Para o psicólogo, geralmente as pessoas querem ser vistas e têm a necessidade de se relacionar. Francis ressalta a importância do olhar na formação dessas relações e também a desconstrução dela. “Eu olho e digo ao outro quem ele é e o outro lança o olhar sobre mim. A gente vive das relações e do reconhecimento e o olhar pode melhorar ou piorar a minha existência”, relativizou.
O olhar seria um ponto crucial para a formação das relações e o olhar sem enxergar, ou seja, o olhar indiferente para aqueles que estão em determinadas classes mais baixas, poderia ser a principal causa da invisibilidade social. O preconceito em relação aos códigos, por vezes não aceitos pela maioria social, ou não tolerados, ou mesmo desconhecidos pela sociedade, faz com que aumente a invisibilidade, por exemplo, o conhecimento em determinadas áreas do saber. “A saúde da mulher lésbica, por exemplo, é um produto que se constitui invisível. As pessoas não percebem e não identificam como legítima e diferente. E aí não se estuda, não se sabe quais são as necessidades. Há outras invisibilidades”, argumentou Francis Deon Kich.
Consequências
Há indivíduos que em sua invisibilidade social constroem mecanismos e estratégias de atuação que, por vezes, trocam de papel e saem da passividade para a atividade e visibilidade. As estratégias são inúmeras e as consequências também, mas o uso da violência, das drogas, do álcool são ferramentas de escape para a inquietude da situação em que convivem.
Em outros indivíduos afloram patologias e descompensações, dependendo do estado comportamental, do estilo de vida, da personalidade e do grau de indiferença. “A indiferença pode até matar subjetivamente uma pessoa e há consequências negativas”, destacou Francis Deon Kich.
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