Pesquisadores estudam autismo usando dentes de leite de crianças
Brasil e Mundo 10/06/2013 08h52Para entender o autismo, um grupo de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), em parceria com o professor Alysson Muotri, da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, está desenvolvendo um projeto chamado A Fada do Dente. Durante o estudo, os pesquisadores têm coletado dentes de leite de crianças com autismo para – a partir das células da polpa (parte mole e avermelhada) – transformá-las em células-tronco diferenciadas em neurônios. Com isso, pretendem identificar as diferenças biológicas existentes nos neurônios com autismo, estudar o funcionamento e testar drogas.
“O foco do estudo é procurar entender o que acontece dentro do cérebro do paciente com autismo”, disse Patrícia Beltrão Braga, bióloga, professora da USP e coordenadora da pesquisa no país, em entrevista à Agência Brasil. Segundo ela, para que isso ocorra, seria preciso acessar as células que estão dentro do cérebro dos autistas. A ideia, então, foi recriar um modelo análogo, baseado na técnica desenvolvida pelo japonês Shinya Yamanaka, ganhador do Prêmio Nobel de Medicina no ano passado.
Ele desenvolveu um método de reprogramação de uma célula já adulta transformando-a em uma célula-tronco semelhante às embrionárias, ou seja, as células adultas são rejuvenescidas até a fase correspondente a seis ou sete dias após a fecundação do óvulo. “A partir deste momento, pegam-se essas células e se produzem os neurônios, já que essas células embrionárias têm a capacidade de virar qualquer tecido ou órgão do corpo”, explica a pesquisadora.
Patrícia aprendeu a técnica de reprogramação celular desenvolvida por Yamanaka em 2008, quando foi aos Estados Unidos. Um ano depois começou a aplicá-la aqui no Brasil a partir das células de polpa de dentes de leite. “Pegamos as células de polpas de dentes de leite e produzimos as células embrionárias, que não são embrionárias de verdade e são chamadas de pluripotentes induzidas [técnica que rendeu o prêmio a Shinya Yamanaka]”, disse. “A gente programa essas células como se as puséssemos numa máquina do tempo: elas [células] voltam no tempo e viram células semelhantes às embrionárias para que depois consigamos induzir essas células a se diferenciarem e a produzir neurônios”, acrescentou.
A escolha pelas células da polpa do dente de leite se deu, segundo Patrícia, principalmente pela facilidade de obtenção. Mas ela também apontou outras vantagens: “Vimos que usando a célula da polpa do dente o procedimento seria um pouco mais rápido. E outra coisa: a origem embrionária das células dos dentes e do sistema nervoso é a mesma, e a gente acredita que ela possa se diferenciar mais facilmente em célula do cérebro do que outras que pudéssemos escolher. Por último, esse dente cai e a pessoa o jogaria fora.”
De início, o estudo pretende somente investigar a doença. Depois, disse Patrícia, os pesquisadores também pretendem fazer experimentações com medicamentos para ver se é possível reverter os sintomas do autismo. “O autismo é uma doença neurodegenerativa, classificada por uma tríade: basicamente o paciente tem uma dificuldade de atenção – ou, muitas vezes, a criança não fala direito – dificuldade de sociabilidade, ou seja, de se fazer amigos. Pode-se também ter alterações de comportamento.”
Os pais cujos filhos são diagnosticados com autismo podem ajudar no projeto entrando em contato com os pesquisadores por meio do e-mail projetoafadadodente@yahoo.com.br. Os pais cadastrados recebem então um kit para recolher o dente do filho quando ele cair. O kit é composto por um frasco com um líquido para preservar as células, gelo reciclável e uma caixa de isopor para mantê-las vivas. O único custo para os pais é com as despesas de envio do kit pelo correio.
Mas caso o dente de leite da criança caia e okit não esteja por perto, a indicação é colocá-lo dentro de um copo com água filtrada e deixá-lo na geladeira para que a polpa não seque e as células não morram. O dente precisa ser colhido com rapidez para que seja viável o uso das células e não pode ser congelado.
Imagem: USP
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