Luiz Eduardo Oliva fala sobre papel do Cultart no fomento à cultura sergipana
Ex-diretor do órgão da UFS, advogado viu nascer o Festival de Arte de São Cristóvão Cotidiano | Por Monica Pinto 21/05/2023 19h00 - Atualizado em 21/05/2023 20h04A Universidade Federal de Sergipe completou 55 anos de fundada na segunda-feira (15), conforme registrou F5 News. Para além de suas atividades em ensino e pesquisa, a UFS tem inegável e contínuo protagonismo na caminhada do setor cultural no estado.
Uma testemunha frequente desse processo é o advogado e jornalista Luiz Eduardo Oliva, 68 anos, cuja ligação com a UFS vem praticamente do nascedouro da instituição, criada em 1968, tendo como reitor João Cardoso Nascimento Júnior. Ele chamou o pai de Luiz Eduardo, o jornalista João Oliva, para estruturar a assessoria de Relações Públicas, um organismo dentro da universidade que pudesse divulgar a instituição recém fundada.
Em 1972, Luiz Eduardo Oliva trabalhava, aos 17 anos, como repórter do Jornal da Cidade, mas logo viria a se ligar profissionalmente à UFS, adentrando seus quadros em 1974, a partir da aprovação em um concurso para datilógrafo. Depois fez outro, este interno, e passou ao cargo de auxiliar administrativo.
Em 1978, ele seria nomeado, pelo então reitor José Aloísio de Campos, coordenador de Promoções Culturais e Recreativas da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis, cujo comando posteriormente assumiu. Em 1981, o reitor Gilson Cajueiro o nomeia pró-reitor de Assuntos Estudantis e, em 1990, Alencar Filho o convida ao cargo de diretor do Centro de Cultura e Arte (Cultart) da UFS, vinculado à Pró-Reitoria de Extensão, que ficaria sob responsabilidade de Luiz Eduardo Oliva no ano seguinte, 1991.
“Eu tive uma ligação muito forte com o Cultart, mas essa ligação também vem das atividades como bolsista de arte do próprio centro, quando eu fazia teatro com [o ator e diretor] Jorge Lins e outras pessoas do início”, disse Luiz Eduardo Oliva ao F5 News.Nessa entrevista ao portal, o multifacetado servidor público, advogado, professor, jornalista e artista, revela aspectos da importância do Centro de Cultura e Arte da UFS para a vida sergipana. E atesta uma contribuição do Cultart para muito além do Festival de Arte de São Cristóvão, o FASC, que completou 50 anos no final de 2022.
F5 News – Como aconteceu a criação do Cultart e o que a impulsionou
Luiz Eduardo Oliva – A Universidade Federal de Sergipe já nasceu com uma vocação para a cultura. Isso porque reuniram-se para a criar grandes intelectuais de Sergipe que atuavam, muitos deles, nos cursos isolados, a exemplo de Silvério Fontes, Thétis Nunes, Dom Luciano Cabral Duarte, Albertina Brasil, Clodoaldo de Alencar e Tereza Prado. Esses grandes intelectuais já eram professores e tinham essa vocação do fazer cultural do estado, que é levada nesse corpo de docentes que, de certa forma, são fundadores da UFS.
A universidade tinha três pilares, ensino, pesquisa e extensão, a extensão era o que ia além dos muros da universidade e foram criados órgãos internos voltados a esse pilar, por volta de 1970 ou 1971. O reitor João Cardoso criou uma Coordenação de Arte e Cultura, portanto, a Cultart, e entrega sua gestão à professora Albertina Brasil, do curso de Serviço Social. Ela depois viria a ser presidente da Funarte, Fundação Nacional de Arte, à época um dos cargos mais importantes da cultura brasileira.
Então, cria-se o Festival de Artes São Cristóvão e a Cultart, que é encarregada de comandar o festival. Mas a Cultart cresceu – por conta do festival inclusive –, virou Centro de Cultura e Arte e passou a funcionar na Rua da Frente, onde era a antiga Faculdade de Direito. Ali cria-se também o Teatro Juca Barreto, lá atrás tinha uma sala de dança, havia galerias de arte todas as sextas-feiras, havia o Clube da Sexta que o DCE [Diretório Central dos Estudantes] promovia e havia toda uma programação cultural para além do Festival de Artes de São Cristóvão.
F5 News – Como surgiu a ideia do FASC?
Luiz Eduardo - Por conta da comemoração do Sesquicentenário da Independência [em 1972], o reitor João Cardoso decide obedecer a um comando do governo da época, que queria fazer alguma coisa em relação às instituições federais. Aí, ele pede uma opinião ao meu pai, João Oliva: que tipo de comemoração existia? E meu pai sugere um festival da primavera, que é na verdade um festival em São Cristóvão, de artes e de corais, porque a Universidade, quando surge, já forma o seu coral com o maestro Antônio Carlos Plech.
Eu diria que a vida cultural de Sergipe é antes do festival e depois dele. Mas é preciso também acentuar que havia uma pujança cultural no estado, grandes intelectuais. A universidade, através do Cultart, é catalisadora desse fazer cultural. A grande importância do centro é ser catalisador como órgão estatal, com verbas, com estrutura, que vai se fazendo aos poucos, para que essa cultura que existia pontual, passe a ter uma certa coordenação e ela deságua anualmente no Festival de Artes de São Cristóvão.
F5 News - Que impactos sobre a sociedade sergipana podem ser atribuídos ao Cultart?
Luiz Eduardo - O centro não só fazia o festival de São Cristóvão, como promovia concursos, abraçou, por exemplo, o Concurso de Poesia Falada do Nordeste. Na época que eu fui pró-reitor, a gente teve um prêmio de teatro – o Arlequim de Mármore - que premiava as principais figuras de destaque no teatro sergipano, ator, melhor ator, melhor peça.
A bolsa de arte possibilitou a existência do grupo expressionista de teatro; o Raízes também teve bolsas, vários grupos de teatro, de música sergipana, giravam em torno da universidade.
F5 News – Em que dimensão o Cultart abriu caminhos para a cultura e a arte sergipanas?
Luiz Eduardo - Toda a formação cultural de políticas públicas do Estado tem, no Cultart, um centro basilar. Importante dizer que em um determinado momento a cultura sergipana não tinha organizações estatais que cuidassem do setor. Isso começa nos anos 60, quando Antônio Garcia era o secretário de Educação do governo Luiz Garcia, no final dos anos 50, e aí cria a Secretaria de Educação e Cultura, repetindo a ideia do MEC. Posteriormente é criado o DCPH, Departamento de Cultura e Patrimônio Histórico, mas não tinha um organismo próprio só para a questão da cultura.
Nisso a universidade dispara na frente com o Cultart, toda a cultura sergipana girou muito em torno do centro que teve uma grande liderança nas políticas públicas em torno da formação cultural. Depois dele é que o governo Augusto Franco (1979/1982) cria a Subsecretaria de Cultura e Arte e entrega na mão do jornalista Luiz Eduardo Costa. Ali era o embrião da futura Secretaria de Cultura do Estado, que vai se dar no governo [Antônio Carlos] Valadares (1987/1991), através da pessoa de um grande jornalista brasileiro, um dos maiores de todos os tempos, o sergipano Joel Silveira, que vem exclusivamente para Sergipe administrar a área da Cultura e ali é que tem o pontapé inicial do Estado.
Em 1985, [o prefeito] José Carlos Machado cria inicialmente a Secretaria de Cultura de Aracaju – o embrião que virou a Funcaju [Fundação Cultural Cidade de Aracaju] – e a entrega à professora Ofenísia Freire.
Essas iniciativas, e também com o Conselho Estadual de Cultura, e que vão formando uma política cultural do Estado. E tudo isso tem um grande nascedouro praticamente no Cultart.