Fartura de adrenalina, suspense e aventura em duas prisões | Levando a Série | F5 News - Sergipe Atualizado

Fartura de adrenalina, suspense e aventura em duas prisões
“Prison break” e “Orange is the new black” extraem de infernos muito deleite
Blogs e Colunas | Levando a Série 27/11/2020 16h00

Estar em uma prisão obviamente não é nada agradável, ainda mais no Brasil, onde a maioria é um depósito de detentos, a misturar homicidas com ladrões de galinhas, em celas quase sempre muito acima da capacidade. Tudo bem que estar preso é uma punição, não um SPA, mas a ideia central deveria ser recuperar aquela pessoa que errou, ao invés de funcionar como um escritório do crime organizado. Dito isso, é no sistema prisional norteamericano que se desenrolam as duas sugestões de hoje. São histórias nas quais sobra adrenalina, especialmente em Prison break, que passamos a comentar, disponível em dois serviços de streaming: Amazon Prime Video e na Globoplay. 

Como o nome deixa claro – “Fuga da prisão” –, é disso que se trata. Mas no que poderia ser apenas uma série repleta de ação, Prison break tem características singulares que justificam assisti-la. Primeira, a gente torce pelo “bandido”, já que ele é inocente – isso não é spoiler, é o fato sobre o qual se ergue a narrativa; segundo, cativa pela inteligência demonstrada no esmerado planejamento da fuga. O inocente é Lincoln Burrows, que espera sua execução na fictícia Penitenciária Estadual de Fox River, sentenciado à morte pelo assassinato de ninguém menos que o irmão da vice-presidente dos Estados Unidos.

Convencido de que ele não era o autor do crime, o irmão de Lincoln, Michael Scofield, tenta assaltar um banco com o objetivo de ser preso, ciente de que seria enviado ao mesmo presídio, onde colocaria em prática o plano genial que já arquitetara para fugirem juntos.

A liga entre os dois atores é sensacional. Michael Scofield, engenheiro de formação, é interpretado pelo inglês criado nos EUA Wentworth Miller – a meu ver, em seu melhor papel. Um cara simplesmente brilhante, calculista ao extremo e capaz de manter uma invejável frieza nos momentos de grande tensão e expectativa, rotineiros na série.  Gosto muito desse gênero, já que, na ficção, ficar com a respiração em suspenso me diverte, ao contrário de na vida real.  O também inglês Dominic Purcell, por seu turno, imprime um caráter muito especial a Lincoln Burrows, o irmão mais velho, bode expiatório numa trama poderosíssima, a envolver quem menos se espera - em tese. A advogada Veronica Donovan é uma ex-namorada de Lincoln e atual amiga, que lança mão de todos os recursos jurídicos para inocentá-lo, sem sucesso. A atriz Robin Tunney, sempre competente, é muita conhecida no universo de séries, tendo sido, por exemplo, protagonista na ótima The mentalist, também disponível na Amazon. 

Atingido o objetivo de compartilhar cadeia com o irmão, Michael Scofield precisa ir diariamente à enfermaria, já que o espaço é fundamental em seu plano de fuga. Nesse intento, opera uma artimanha que o leva a conviver com a bela médica Sara Tancredi (Sarah Wayne Callies), a quem engana com dor no coração. Mas o pior mesmo foi ter de se juntar a criminosos de alta periculosidade, os detentos Theodore 'T-Bag' Bagwell (Robert Knepper), assassino e pedófilo, e o mafioso John Abruzzi (Peter Stormare). Ao menos seu colega de cela é um sujeito que errou, sim, mas dotado de bom coração – o apaixonado pela noiva Fernando Sucre (Amaury Nolasco).

Algumas curiosidades: Wentworth Miller e Dominic Purcell são amigos, foram responsáveis pela criação da quinta temporada da série e parte das gravações aconteceu na Joliet Prison, no estado de Illinois. A exibição de Prison break foi proibida em 13 presídios norteamericanos. Faz sentido, vai que dava ideia...

Mesmo com a violência permeando a série, a primeira temporada em especial é uma ode à sagacidade, personificada pelo protagonista Michael Scofield. E, em meio às cenas fortes, há também amizade, amor, propósito e obstinação em farta dose. Ou seja, o presídio é um recorte bem fidedigno do mundo em que vivemos, com destaque para as agressões perpetradas por alguns agentes penitenciários.

Prisão bem melhorzinha – se é que cabe o termo – constitui o cenário de Orange is the new black (Laranja é o novo preto), um trocadilho sobre o “pretinho básico” coringa da mulherada que, nesse caso, remete à roupa laranja das detentas nos EUA. Inclusive os uniformes das presas na série foram adquiridos à mesma empresa que os fornece para as penitenciárias federais daquele país. 

A história é baseada no livro homônimo, um relato autobiográfico de autoria de Piper Kerman, uma jovem de classe alta que se formou em Teatro, nos anos 90, no prestigiado Smith College, uma das melhores faculdades norteamericanas, segundo a Forbes. Bissexual assumida, pouco depois dessa vitória acadêmica, ela se envolveu com uma traficante internacional de drogas, que a convenceu a levar uma maleta de dinheiro para a Europa.  Resumo da ópera: a casa caiu e ela findou condenada a 15 meses de detenção em Danbury, uma prisão federal no estado de Connecticut. 

Embora haja uma profusão de associações diretas entre o livro e a série, a começar do nome da protagonista, também Piper, só que Chapman - muito bem conduzida pela atriz Taylor Schilling –, parte do roteiro para a telinha foi sendo adaptado aos sabores do gosto do público. Exemplo: Alex Vause, a personagem inspirada na traficante que colocou a Piper real nessa roubada, mantém uma relação amorosa com a Piper fictícia – o que não aconteceu de fato, elas mal se falaram depois da condenação de ambas, que sequer cumpriram pena na mesma prisão.  Mas arrisco dizer que o objetivo foi apostar no romance, já que as duas, na série, se amam, apesar dos altos e baixos. 

Sobre a personagem Alex Vause, uma observação importante: ela é interpretada pela excelente atriz Laura Prepon, que encarnou Donna Pinciotti na série That's 70 Show – disponível na Netflix e sobre a qual ainda vou me aprofundar, já que uma das minhas preferidas. Outra personagem muito potente e carismática é a detenta Red, uma espécie de chefe do presídio, mandachuva da cozinha e assim chamada por seus cabelos vermelhos. Há muitas colegas de cárcere de personalidades singulares e as histórias que vivenciam proporcionam um enredo bem amarrado, surpreendentemente divertido e leve em muitos momentos – se a gente se abstrai dos revoltantes.  

O livro que gerou a série foi adaptado por Jenji Kohan, a mesma criadora da ousadíssima Weeds, e um dos fatores que me soa especialmente interessante é a proposta de contar um pouco da vida pregressa de algumas detentas, as coadjuvantes mais frequentes. Assim, mostra-se, ao menos em parte, os caminhos pelos quais elas chegaram a cometer um ou vários crimes. Num contraponto às condenadas, é penoso observar o comportamento de alguns agentes penitenciários – assim como em Prison break, tão ou mais criminosos do que aqueles(as) presos(as) –, ressalvando que esse pendor à barbárie não se aplica a todo o universo desses profissionais. De qualquer forma, cai muito bem conhecer algumas realidades adversas enfrentadas por pessoas desde a infância – por vezes, desde o nascimento – e quem sabe estimular a misericórdia, nesses tempos de empatia em escassez.

Piper Kerman, a propósito, acabou se saindo muito bem da experiência no sistema prisional, após narrá-la em seu livro: tornou-se membro de uma associação penitenciária feminina e é frequentemente convidada a ministrar palestras a turmas de direito, criminologia, sociologia e criação literária. E destaque-se que ela assume ter tido um melhor tratamento na cadeia simplesmente pelos fatos de ser de classe alta e branca. Alguém surpreso?

Por fim, deixo à reflexão uma frase de ninguém menos que o Mahatma Gandhi: “A prisão não são as grades, e a liberdade não é a rua; existem homens presos na rua e livres na prisão. É uma questão de consciência”.

Para maratonar:
Prison break – cinco temporadas, total de 89 episódios, disponível completa na Amazon e na Globoplay; 

Orange is the new black – sete temporadas, total de 91 episódios, disponível completa na Netflix.


 

Mais Notícias de Levando a Série
‘The Feed’: confira a série comparada ao sucesso Black Mirror
12/02/2022  17h00 ‘The Feed’: confira a série comparada ao sucesso Black Mirror
Arte: Sidney Xambu
24/01/2022  17h20  ‘Fique Comigo’: uma eletrizante minissérie cheia de reviravoltas
Confira as cinco primeiras colocadas no Top 10 de ‘Levando a Série’ em 2021
19/12/2021  20h00 Confira as cinco primeiras colocadas no Top 10 de ‘Levando a Série’ em 2021
Confira a primeira parte do Top 10 de ‘Levando a Série’ em 2021
12/12/2021  21h30 Confira a primeira parte do Top 10 de ‘Levando a Série’ em 2021
Arte: Sidney Xambu
05/12/2021  15h00 ‘Locke & Key’ e ‘A Roda do Tempo’: a fantasia e seus lucros levados muito a sério
F5 News Copyright © 2010-2024 F5 News - Sergipe Atualizado