Não basta educação: é preciso formar consciências éticas e republicanas, diz Armando Jr | Joedson Telles | F5 News - Sergipe Atualizado

Não basta educação: é preciso formar consciências éticas e republicanas, diz Armando Jr
Blogs e Colunas | Joedson Telles 25/08/2019 07h19

O advogado Armando Batalha Júnior, vereador suplente de Aracaju, comenta, nesta entrevista, a sua passagem pela Câmara de Aracaju, destacando, entre outros pontos, a Lei do Complaince, de sua autoria, que ganhou notoriedade nacional por ser um importante instrumento de combate à corrupção no setor público. “Toda a administração poderá contar com políticas preventivas que proverão uma gestão administrativa e organização pública eficiente estimada pela postura ética e pela efetividade dos serviços”, comemora Armando, sugerindo também mais investimentos em cultura, e educação de berço. “No Brasil, há uma dissonância cognitiva que leva à confusão entre autoridade e autoritarismo, um vício nacional herdado do período da escravatura e do coronelismo de aldeia, com práticas que redundam um comportamento antissocial e, por vezes, criminoso, de detentores de poderes econômicos e de posses. Não basta a educação se também não se forma, em nossas escolas, consciências éticas e verdadeiramente republicanas”, ajuíza. A entrevista:

Como avalia a sua passagem pela Câmara de Aracaju?

Avalio como bastante positiva, acredito que deixei a impressão que é possível fazer diferente! A bem da verdade tem me surpreendido o quanto as pessoas têm me cumprimentado por em tão pouco tempo conseguir um ritmo tão frenético e intenso. Eu sabia que minha jornada nesse momento seria curta, sabia também que sofreria julgamentos e então procurei mostrar todo meu potencial, porque sempre me preparei para mostrar que a política deve ser para pessoas sérias e compromissadas. Para servir e não se servir da coisa pública. Ademais, tive a visão de trazer para Aracaju a Lei do Complaince e acabou tendo uma repercussão Nacional por essa aprovação, pois Aracaju passou a ser a primeira cidade do Nordeste a aprovar essa lei.

Em pouco tempo, o senhor fez mais por Aracaju do que muitos que estão há muito tempo exercendo um mandato. O Legislativo trabalha pouco no Brasil?

Depois dessa passagem, eu percebi que quem leva a sério trabalha muito! Vou dizer o porquê: Política é uma atividade linda, você muda a vida das pessoas, mas foi deturpada desde o começo da nossa história, ainda na nossa colonização, os interesses particulares sempre vieram à frente dos coletivos. Se você decidir levar a sério você trabalha muito, porque existem regras, por exemplo, para você aprovar um projeto, questões constitucionais, alcance da função do legislativo. Então, não é só ir ao plenário fazer discursos, visitar comunidades, apartear colegas e parabenizá-los, é muito mais! Eu despendi muita energia nesses quatro meses. Tinha noites que dormia apenas quatro horas, porque sou assim mesmo, intenso, não gosto de fazer nada morno. Apresentei 10 Projetos de Lei e fiz mais de 70 discursos sobre temas relevantes e defesas dos projetos, para isso lia quatro periódicos quase todos os dias. Mas confesso que as sessões da câmara deviam ser mais extensas, três dias na semana é muito pouco. Inclusive, trago aqui uma notícia em primeira mão: fui eu quem redigiu o Projeto de Lei do vereador Fábio Meireles para reduzir o recesso parlamentar, enquanto advogado, bem antes de assumir. Mas, infelizmente, não foi aprovado. Não é à toa que as pessoas se revoltam, porque a carga de trabalho do trabalhador é muito alta. Além do mais, dois recessos por ano é muito. Não concordo com isso.

Quem está de fora também nutre a impressão que os debates no Poder Legislativo poderiam ter mais qualidade. Perde-se muito tempo em discussões que pouco contribuem a favor do coletivo?

Perde-se sim. Explico: um vereador vai à tribuna apresentar um projeto, reivindicar algo, alguns aparteiam. Esses apartes em sua grande maioria são elogios, “rasgação de seda”, quando, na verdade, o mais importante seria contribuir para aquela ideia, se boa fosse, independente do parlamentar que propusesse, situação ou oposição, virar ação efetiva para o coletivo. Palavras desacompanhadas de ações concretas em nada servem. Daí quem estuda em nosso país, faz mestrado, passa uma vida estudando e vê um representante seu, que sequer fala o português claro numa tribuna e, muitas das vezes, ganhando mais do que ela, se decepciona. Acho que nesse ponto, nossa democracia errou, deveria ter um filtro de, por exemplo, só poder ser eleito se tiver uma boa instrução, que entenda seu papel e que tenha noção técnica da sua função. Ora, num concurso público, não é assim? Porque na política é diferente?

Entre seus os Projetos de Lei, o Compliance ganhou mais notoriedade. Como o senhor explica isso?

Eu sabia que precisava deixar um legado. Também tinha noção do imenso alcance desse Projeto de Lei, fruto do combate à corrupção, inclusive em nível nacional. Pessoas de outros estados deram depoimento nos parabenizando pela proposta, a exemplo da secretária de Estado de Integridade e Governança de Santa Catarina, Dra. Naiara Augusto. Deus me deu a visão de enxergar isso e me aprofundei sobre o tema. A necessidade de agir com mais transparência e respeito às regras é um aspecto que favorece a expansão do compliance na administração pública. Como advogado criminal de formação, já advoguei para muitas empresas e sabia que a maioria dos problemas de corrupção dizem respeito às relações incorretas entre empresas e gestão pública. A sociedade está cada vez menos tolerante a erros que prejudicam a qualidade dos serviços públicos. Além disso, o uso de recursos estatais precisa ser bastante eficiente para haver uma resposta mais rápida e concreta às demandas da população. É imprescindível que o cidadão seja atendido por servidores públicos que seguem códigos de conduta e atuam com base em valores como honestidade e integridade. Com a implantação do compliance em Aracaju, toda a administração, direta e indireta, poderá contar com políticas preventivas que proverão uma gestão administrativa e organização pública eficiente estimada pela postura ética e pela efetividade dos serviços. Com alegria na alma, hoje afirmo que a lei 5.241/2019 é lei em nosso município.

O político é sempre posto na mira do tiro quando o assunto é corrupção. E por ser um representante da sociedade legitimado em um cargo público não poderia ser diferente. Mesmo assim, há sempre novos casos de malversação envolvendo um político. A corrupção é algo crônico no Brasil?

Em meus discursos, eu afirmava sempre que não adianta mais leis para evitar crimes, pois já temos uma inflação legislativa altíssima, temos que mudar a rota, investir em cultura, educação de berço. No Brasil, há uma dissonância cognitiva que leva à confusão entre autoridade e autoritarismo, um vício nacional herdado do período da escravatura e do coronelismo de aldeia, com práticas que redundam um comportamento antissocial e, por vezes, criminoso, de detentores de poderes econômicos e de posses. Não basta a educação se também não se forma, em nossas escolas, consciências éticas e verdadeiramente republicanas. Vejamos o exemplo da Coreia do Sul. No início do século, esse país era, assim como nós, de terceiro mundo, com taxas de analfabetismo altíssimas. No fim da década de 1990, a Coreia se transformou em uma potência de primeiro mundo. Por quê? Porque em um determinado momento, decidiram investir 50% do PIB (Produto Interno Bruto) na educação. Pronto. Foi preciso apenas uma geração para que virasse o que é hoje. Isso evidencia que isso só será possível quando conseguirmos políticos que pensam e planejam ações futuras. O desvio do dinheiro público é o crime mais grave que se pode cometer. Pois, quando desvio de uma empresa privada, prejudico a um dono, respondo ao código penal e vou pagar pelo meu crime. Mas quando se desvia de uma empresa pública, eu estou retirando de todos. Isso é ainda mais grave. Agora, não adianta criticar os políticos que cometeram desvios públicos se ainda furamos fila, oferecemos vantagens para algum benefício próprio, estacionarmos em vagas de deficientes... Temos que mudar nossa cultura do jeitinho, do tirar vantagem a todo custo.

O eleitor não estimula estes políticos que usam da desfaçatez quando votam em troca de dinheiro, cargos ou qualquer coisa?

Com certeza. Olha: eu saí da eleição decidido a não ser mais candidato, pois muitas das vezes eu ia apresentar um projeto, uma boa ação para o coletivo e o eleitor me pedia algo em troca do voto. Aquilo me deixava decepcionado, pois não é nessa política que acredito e que pude colocar em prática nesses quatro meses. É a política do coletivo, de fazer ações mais amplas. Ora, se eu me submeto a ter que gastar muito com prática de compras de votos, teremos uma eleição cara, e como você vai cobrir esse “investimento”. Obviamente se submetendo a práticas espúrias, isso não vou querer nunca.

É muito difícil ganhar uma eleição sem comprar votos? Pelo perfil do eleitor é possível responder isso?

Felizmente está mudando. Vide a última eleição. Aqui mesmo em nosso estado, tivemos a eleição do senador Alessandro Vieira que teve gastos irrisórios e foi um fenômeno de votos. Com justiça. Ao passo que outras campanhas portentosas, calcadas em práticas indecorosas, ficaram para trás. Isso nós da um alento, porque a população está mais atenta. Tudo que vem ocorrendo em nosso país, sucessivos escândalos deixaram as pessoas com a noção de que seu voto tem peso e é o único instrumento capaz de mudar o nosso atual quadro. Isso me dá ânimo para uma nova eleição, pois quando falo em complaice, integridade, apliquei em nosso mandato quando abri mão ter carro oficial, gasolina e usei pequena parte da verba indenizatória, trazendo uma economia aos cofres públicos de quase R$ 20.000.00 (vinte mil reais), imagine isso em quatro anos?

E o exemplo sendo seguido não apenas pelos demais vereadores de Aracaju, mas também pelas demais Casas Legislativas do Brasil...

Como avalia a administração do prefeito Edvaldo Nogueira à frente da Prefeitura de Aracaju?

Avalio como uma boa gestão. Edvaldo é um prefeito gestor, tem zelo pelo dinheiro público. Sua idoneidade nunca foi questionada, foi um vice fiel de Marcelo Déda e conseguiu criar sua própria identidade. Ele tem a minha admiração, quando falei a ele do nosso projeto de complaice ele mostrou interesse de plano em aplicar em sua administração. Em 31 meses, sua gestão tem alcançado um alto grau de efetivação dos projetos que se dispôs a executar, a prefeitura é apta a contrair empréstimos porque faz seu dever de casa no quesito fiscal.

E a gestão Belivaldo Chagas?

Belivaldo me parece uma pessoa séria, mas acho que seu slogan de campanha “chegou pra resolver” criou uma expectativa muito grande nas pessoas por conta da pífia gestão que o antecedeu. É bem verdade a crise recente por que passa os Estados que asfixiados pelo encolhimento da economia e da arrecadação de impostos sofrem mais diretamente que o Governo Federal o impacto da crise orçamentária. Não é apenas Sergipe, mas praticamente todos os governadores enfrentam, hoje, algum tipo de fragilidade fiscal, seja queda de receita, contas no vermelho, endividamento ou gastos com pessoal em excesso, além da questão da previdência, pois Sergipe teve um rombo de R$ 478,16 milhões nas contas da previdência, sendo o terceiro maior do Nordeste, perdendo apenas para a Bahia e Rio Grande do Norte. Ademais, essa questão da cassação pode atrapalhar a questão administrativa e criar uma instabilidade em nosso Estado, o que é horrível para nossa economia.

O governo Bolsonaro lhe agrada?

Em que pese suas palavras desmedidas que acabam, muitas vezes, atrapalhando a pauta do país, me agrada, sim. Enxergo mais pontos positivos do que negativos. Explico: O governo conseguiu conter a inflação, articulou o acordo Mercosul-União Europeia e combate à corrupção. E não é fácil consertar os pneus com o veículo em movimento, pois, tem que administrar, tentando ao mesmo tempo consertar um país esfacelado por décadas de corrupção, incompetência e loteamento de cargos. Do ponto de vista do projeto liberal econômico do governo está avançando. A reforma da Previdência, principal projeto deste início do governo, também está avançando bem, faltando ser votada pelo Senado, depois deve ser pautada a reforma tributária, que em nosso país é desumana.Também pode ser considerada uma vitória de Bolsonaro a aprovação da MP que cria o programa de revisão de benefícios do INSS para combater possíveis fraudes.

O que projeta para o seu futuro político?

Tenho recebido alguns convites de alguns partidos para ser candidato a prefeito em Aracaju e em São Cristóvão. Com a alta repercussão positiva do nosso mandato é natural e fico lisonjeado com isso. Mas mantenho os pés no chão, continuo me preparando para continuar pensando em soluções modernas e criativas para nosso Estado como um todo. Eu amo Sergipe, me sinto muito bem aqui, uma terra de pessoas de bem, trabalhadoras e que merecem ter uma qualidade de vida melhor, serviços públicos prestados com excelência, e que nossos jovens possam estudar e concorrer a cargos públicos em pé de igualdade e que cargos em comissão sejam uma exceção e não a regra. As pessoas de bem têm me aconselhado a concorrer novamente. Vou analisar, pois também amo a profissão que decidi seguir que é a advocacia e ser professor universitário. Uma coisa é certa: com cargo público ou não, me posicionarei na dianteira das mudanças que acredito e que são viáveis para nossa sociedade.

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