“Fantasma eu nunca fui. Quem trabalha tem que receber” | Joedson Telles | F5 News - Sergipe Atualizado

“Fantasma eu nunca fui. Quem trabalha tem que receber”
Blogs e Colunas | Joedson Telles 17/12/2017 07h30 - Atualizado em 17/12/2017 07h42

Na semana passada, Sergipe foi apresentado a uma lista de pessoas que, segundo o Ministério Público do Estado de Sergipe, receberam dinheiro da Prefeitura de Aracaju, na gestão do ex-prefeito João Alves Filho, sem trabalhar. A “Operação Caça Fantasma” do MPE já contabiliza um prejuízo de mais de R$ 1,2 milhão aos cofres públicos. Ao noticiar os fatos, contudo, setores da imprensa (por falta de ética e responsabilidade ou despreparo) não deixaram evidente que as pessoas estão denunciadas, e não condenadas. Não enfatizaram que todas elas terão direito a defesa e que são inocentes até que provas irrefutáveis do contrário sejam apresentadas e a Justiça condene. Entre estas pessoas está Jorge Andrade Ribeiro - um administrador de empresa, aracajuano, de 65 anos, cuja conversa com os promotores do caso foi filmada e as imagens veiculadas nos principais telejornais de Sergipe. Indignado, Jorge Ribeiro explica, nesta entrevista como chegou à PMA e como era o seu trabalho. “Eles passavam os links, e eu passava a fazer a divulgação do material produzido pelos jornalistas não só nas redes sociais, como Twitter e Facebook, como também em grupos de Whatsapp”, explica Jorge Ribeiro. "Eu vesti a camisa. Eu criei muitas inimizades, inclusive com jornalistas amigos. Eles faziam as críticas e eu defendia, muitas vezes iam para o lado pessoal." A entrevista:   

Como soube que estava sendo investigado pela Operação Caça-Fantasma?

Eu fui intimidado pelo Ministério Público. Para mim, foi uma surpresa porque eu não sabia nem o que era essa intimação para ir prestar um depoimento. Marcaram para 11 horas. Cheguei 10h30, e fui atendido meio dia. Meu depoimento demorou em torno de dez minutos. Tem mais ou menos um mês isso. Eu não sabia nem o que iriam perguntar e nem o que seria esse depoimento.

E o que lhe perguntaram?

Foi perguntado se eu trabalhava no gabinete do ex-prefeito José Carlos Machado, e confirmei que era assessor dele. Expliquei que o conhecia há bastante tempo e ele me confiou cuidar das mídias sociais, inclusive me colocou à disposição da Secretaria de Comunicação Social (Secom), que na época tinha como secretário Carlos Batalha. Mas eu tinha mais contato com André Carvalho, que era o secretário-adjunto. (Na verdade, André Carvalho era um assessor especial da Secom. O jornalista Raimundo Brito era o secretário adjunto). A gente fazia um trabalho em conjunto. Não existia na prefeitura um grupo de Whatsapp. Eu dei a sugestão de criar e foi implantado. Todos os órgãos e secretarias tinham os assessores de imprensa. Jornalistas. Mas eu senti que não existia uma divulgação em termos de redes sociais. Existia um site da prefeitura, uma página da prefeitura no Facebook, mas ninguém curtia nem comentava. Existia uma necessidade de fazer uma divulgação maior dos atos da prefeitura e não existia uma comunicação interna entre as secretarias com a Secom. Criamos um grupo com quase 50 pessoas, todos de órgãos e secretarias. Até me surpreendi com o número de pessoas que tinha no grupo. Começamos a trocar informações. Eles passavam os links e com isso eu passava a fazer minhas divulgações do material produzido pelos jornalistas não só nas redes sociais, como Twitter e Facebook, como também em grupos de Whatsapp que eu sempre participei. Inclusive, uma pessoa muito próximo do prefeito João Alves, o Edson, era especialista em marketing digital e sempre se reunia coma gente.  

Então, era um trabalho externo. Não existia a necessidade de se deslocar ao prédio da PMA todos os dias. O senhor trabalhava diretamente nas redes sociais? 

Hoje, eu participo de três grupos que dá em torno de umas 600 pessoas. Essas 600 pessoas têm influências. São pessoas como jornalistas, políticos, pessoas que interessam e precisam saber o que está acontecendo. Inclusive, algumas pessoas faziam críticas à administração dentro dos grupos e eu defendia. Era esse o trabalho. Era um trabalho externo. Não era administrativo, que é aquele que bate ponto sai do expediente e volta. Eu trabalhava das 6 horas da manhã até 10 da noite, com intervalos. Sempre eu estava atento às divulgações – inclusive nos finais de semana. Como eu sou conhecido, atendia as demandas (externadas nas redes sociais) que o povo tinha e pedia as secretarias para atender. Solicitava a Emsurb, Emsurb e até ao próprio José Carlos Machado, que sempre foi um vice-prefeito atuante.

Então, apesar de ser nomeado no gabinete do vice-prefeito, seu trabalho era em sintonia com a Secom?

Era na Secom, mas eu tinha ligação direta com Machado. Ele me mandava sempre informações das atividades dele dentro do trabalho para divulgarmos. Sempre, ele me pedia opiniões, pedia pra eu fazer alguma pesquisa na internet.

E como foi o convite?

Machado já me conhecia há muito tempo e conhecia meu trabalho de redes sociais. Muita gente conhece meu trabalho. Um certo dia, um assessor de um deputado federal famoso aqui de Sergipe num grupo de Whatsapp dando os parabéns porque esse deputado atingiu 15 mil seguidores. Eu tenho mais de 17.500. Eu não sou um afigura pública, não sou jornalista, mas tenho mais de 17 mil seguidores. Minhas redes sociais não são locais. Expandem-se no Brasil inteiro. Jornalistas famosos são meus amigos - como Miranda Sá, do Rio de Janeiro, João Gilberto, Cláudio Dantas, do Antagonista. A gente se comunica com frequência. Tudo isso é uma divulgação não só em Sergipe, mas no Brasil inteiro.

O senhor tem ligação com algum partido político?

Há muito tempo, eu tenho uma ligação com o PSDB. O acho um partido bom. Tenho uns 10 anos de filiação.

Quando o senhor tomou conhecimento que havia servidores recebendo dinheiro sem trabalhar ficou surpreso?

Fantasmas existem em todos os setores. Se você for à Casa Civil do Governo do Estado, dizem que têm 800 pessoas lá. Se você for à prefeitura, hoje, com Edvaldo Nogueira devem ter umas 300 pessoas que têm vínculos políticos e são fantasmas. Eu acredito que o Ministério Público e a própria Câmara de Vereadores, a Assembleia, o Tribunal de Contas, Tribunal de Justiça, cabe a estes órgãos essas investigações. Chamaram-me muito de fantasma na televisão. Fantasma eu nunca fui. Inclusive, foi uma exposição errada. Estão explorando muito e não sei qual o motivo, nem o que querem atingir. Querem atingir alguma coisa, mas menos a mim, que trabalhava. E quem trabalha tem que receber.

O senhor estaria sendo usado, então?

Talvez estão me usando. Eu tenho 17 mil pessoas no Facebook que me conhecem e dentro de Sergipe acredito que quem esta na área de jornalismo me conhece.

O senhor explicou tudo isso quando esteve no Ministério Público?

Lá, foi muito curto. Eu pedi a promotora para citar nomes e telefones de alguns jornalistas e radialistas com quem eu me comunicava e me comunico ainda porque eu tenho credibilidade. Eu continuo fazendo esse trabalho porque eu gosto. Sou formado em administração, mas eu adoro jornalismo. Eu deveria fazer jornalismo, mas a minha idade hoje não permite mais.

O que foi colocado pelo Ministério Público?

Perguntaram se eu dividia meu salário com alguém. Eu disse que não dividia porque eu trabalhava. Eu usava meu celular, minha internet, meu notebook. Nada da prefeitura. Quando precisava conversar na Secom ou com Machado eu me deslocava no meu carro. Eu recebia em torno de R$ 1.700,00.

O MPE quer que o senhor devolva o dinheiro?

Não me colocou isso. Mas devolver uma coisa honesta que eu ganhei trabalhando? Eu acho um absurdo. Se existe alguém que não trabalhava que forcem a devolução, que eu acredito até que não vai devolver porque já gastou. Dinheiro pouco se consome. Toda atividade que eu fazia era coordenada por Machado. Eu obedecia a ele. Ele me deu essa tarefa de ajudar a divulgar as ações da PMA. Ele, até meio grosso, dizia pra eu ajudar porque o negócio não estava bom.

Tinham outras pessoas nessa mesma função ocupando um CC?

Tinham CCs, mas não sei se eram requisitados de outro órgão ou de dentro da prefeitura. Existiam outras pessoas que trabalham em redes sociais, mas muito pouco. Muita gente tem medo de redes sociais porque são muito amplas e as pessoas têm medo de se expor. Os jornalistas novos, geralmente, têm medo de perder seus empregos. Ficam calados porque sabem que o prefeito ou o governador vai sair e vem outro. Eles querem ter continuidade. Fazem o feijão com arroz, dando expediente. Eu ouço rádio todo dia e vejo o pessoal atacando e não tem um do governo que vá defender porque são acomodados. Não querem perder o emprego. Eu debatia, brigava, criei até inimigos defendendo o governo de João.

O governo de João Alves foi ruim como a maioria coloca?

Começou muito bom. Eu não sei o que aconteceu, mas, no último ano e meio, a coisa mudou muito. Como eu nunca participava da gestão, eu ouvia falar. Um ano e meio antes de terminar seu governo foi péssimo. Eu me decepcionei porque doutor João sempre foi um cara criativo, trabalhador, pensava sempre no futuro, um famoso tocador de obras e arregaçava as mangas para ir às obras. Eu não sei se ele ficou doente ou sofreu influências de terceiros. A gestão estava totalmente solta. Eu achei muito estranho doutor João dizer que não ia para reeleição e de repente aceitou ir. Ele já não tinha mais fôlego pra nada. Eu acredito que ele não queria ir porque ele é muito inteligente e sabe o caminho.

O senhor tinha contato com ele?

Não. Tinha com Machado. Eu conheci doutor João há muitos anos. Quando ele criou a Habitacional, eu tinha primos que iniciavam também com construtoras. Eu tinha uma amizade muito antiga de família. Depois, ele governador, quando me via, me cumprimentava sempre. Tem uma memória muito boa. Não sei hoje. Eu soube que ele está em Brasília com um Alzheimer forte, está bobão como a gente diz em termo popular. Minha mãe vai fazer 95 anos, tem Alzheimer, há uns seis anos, é triste. Eu tenho em casa um exemplo.

Então, o senhor era uma espécie de “testa de ferro” da gestão João Alves nas redes sociais?

Eu dei a ideia para criar, mas quem criou foi o secretário Carlos Batalha. Ele acatou a minha ideia porque o pessoal não ia para o debate. Só fazia a informação fria. Eu vesti a camisa. Eu criei muitas inimizades, inclusive com jornalistas amigos. Eugênio Nascimento, por exemplo, era muito meu amigo, um excelente jornalista e me bloqueou. Brayner também cortou meu Whatsapp. Eles faziam as críticas e eu defendia, muitas vezes iam para o lado pessoal.

O senhor precisou defender o indefensável, em certos momentos?

Você deve participar de grupos e sabe que começam as ofensas de todo lado, não só políticas. No momento que João estava fraco tinham muitas coisas a desejar do governo, muitas demandas do povo, várias coisas que ainda existem. Ele tem que ter auxiliares bons. Se os auxiliares não chegarem junto o administrador não sabe de nada.

Qual área deu mais trabalho para defender? A coleta do lixo?

Não foi só o lixo, foi geral. A saúde e educação são as bases. Na segurança, doutor João montou uma excelente guarda municipal que hoje não se movimenta. Eu ainda digo que foi excelente a criação de concursos.

João Alves adoeceu, mas não passou o governo para o vice José Carlos Machado. Quem comandava o governo?

A minha área era a de comunicação. Divulgar as notícias nas redes sociais. Não sabia o que acontecia nos corredores e nem queria saber. Mas eu observava que a administração caiu muito.

Como interpretou aquele desabafo de Machado: a equipe de João só queria roubar e João estava defecando pra isso?

Machado sempre foi uma pessoa ativa e ia, mesmo sendo vice, nas secretarias, exigia trabalho do pessoal. Ele pode talvez ter cansado de não ser correspondido e desabafou. Eu acredito que foi um desabafo. Ele pode ter cansado de ver que as coisas não andavam. A administração de João ficou solta, largada.

A imprensa foi injusta com o senhor?

Está sendo. Já me chamaram para dar entrevista, mas eu não vou cair nessas entrevistas porque são armadilhas. Eu não conheço a denúncia, não fui notificado. Quando eu for notificado, eu busco um advogado, inclusive não tenho recursos para contratar um bom advogado.

Como sua família recebeu essa notícia?

Minha mãe está sem memória e não acompanhou isso. É triste eles verem um pai ou irmão sendo execrado pela mídia, principalmente pela televisão que é muito forte. Eu tenho muitos amigos em Sergipe que ficaram impressionados com a liberação e exploração dessas imagens. Telefonaram-me perguntando o que aconteceu, inclusive muitos jornalista amigos meus ficaram impressionados com a liberação dessas imagens na televisão. Eu me sinto injustiçado. Ganhava pouco, num trabalho que não tinha hora, mas eu gosto. Sou respeitado e conhecido. Eu nunca passo uma informação de mentira. Passo as coisas com os links de grandes jornais. Criaram esse termo Caca Fantasma e eu fui no bolo até hoje não sei porquê. Eu não conheço o processo e nem quem foi processado.

Surpreendeu mais o processo em si ou aparecer na TV como fantasma, mesmo ciente que sempre trabalhou?

O processo em si é uma coisa normal. O Ministério Público saber das coisas é muito importante e tem que realmente atuar. Esta divulgação e exploração da mídia, principalmente televisão, não. Isso que me deixou muito triste. Um amigo me falou que estava passando na televisão e me passou até uma gravação que ele fez. Teve a repercussão com meu nome no meio da lista dos indiciados em sites. Jogaram no ar sem saber. Deveriam ao menos ter me perguntado.

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Joedson Telles é um jornalista sergipano formado pela Universidade Federal de Sergipe e especializado em política. Exerceu a função de repórter nos jornais Cinform, Correio de Sergipe e Jornal da Cidade. Fundou e edita, há nove anos, o site Universo Político e é colunista político do site F5 News.

E-mail: joedsontelles@gmail.com

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